domingo, 30 de março de 2008

Ode ao Tabaco (por extenso)

Gostava de ter começado a fumar. Não por prazer ou qualquer sentido estranho de exibicionismo, mas porque parece sempre mais fácil de passar o tempo quando estamos a fumar. Pode não ser verdade, mas quando vejo um qualquer homem, de barba mal feita, casaco castanho e mãos usadas sentado num banco, sem fazer nada, lá está o cigarro numa das duas mãos, direita ou esquerda, tanto faz. E de vez em quando leva o tal à boca e semicerra os olhos por uns instantes enquanto inspira (ou aspira) o fumo. E esses segundos, parece-me a mim, são como fazer o “reset” numa qualquer máquina. A partir daquele momento não mais o aborrecimento se acumula, apenas acaba e começa um novo. Qual o melhor? Ter um aborrecimento interminável? Ou vários e sucessivos com duração suficiente para tirar o cigarro da mão, pensar enquanto se olha para o vazio, e voltar a por o cigarro na boca? Ah, se eu não soubesse que faz um mal terrível escolheria o segundo. Nem pensaria duas vezes. Mas os médicos estragaram tudo! Estragam sempre tudo, raça de bata branca e estetoscópio ao pescoço! “Dá cancro” dizem eles. E eu não quero morrer novo, quero ver os meus netos. E por isso não posso fumar, nem posso fazer todas as outras coisas que os médicos dizem que mata.

Mas é agora, sentado aqui a olhar para o monitor, a sofrer de um tédio inabalável e interminável, que me apetecia fumar um cigarro. Infelizmente ninguém em casa fuma. Ou seja, não há tabaco em lado que se encontre. E eu fico lixado! Podia abrir a janela, acender o isqueiro, esse tenho, e fumar durante cinco ou dez minutos. Fazia o “reset” e era um tempo a menos para o aborrecimento e começava outro. Já não tinha de fazer horas para me ir deitar (ainda não tenho sono) porque nascia tudo outra vez. Podia encarar o tédio de maneira diferente, podia ir dar uma volta, eu sei lá! Mas assim não, assim tenho de ficar por aqui a olhar para o tecto e a desejar que os médicos nunca tivessem descoberto que o tabaco mata. Idiotas sem consideração!

3 comentários:

violent.femme disse...

sim sim sim! como te entendo! e concordo, se concordo! é quase frustrante aqueles momentos vazios em que não sabemos o que fazer, nem como pensar no que quer que seja.
Mas eu não escolheria o tabaco, perdoem-me: escolheria algo que gostei (e eu nem sequer gosto do fumo do tabaco), para esses momentos preferiria algo que me deixa alegremente dormente, chamem-lhe droga ou o que quiserem...

Anônimo disse...

sinto exactamente isso.

mas não-não-não.

não beber não fumar, certo?

estou farta de ser politicamente correcta.

um dia faço-me à estrada armada em jack kerouac ou che guevara na sua juventude. e faço o que bem me apetecer nos momentos x.

afinal, não somos a geração rasca sem futuro?
pois farei jus ao nome. um dia. quiça.

Unknown disse...

pois... nesses momentos tenho outra "droga", chamem-me o que quiserem, mas é nesses momentos que escrevo. Não acho que o tabaco seja a solução para nada, parece-me só mais uma forma de o ser humano escapar ao inevitável. "Ah e tal, tou aborrecido, tenho problemas até ao pescoço, se fumar, passa"... se os problemas continuam lá, de que serve fumar? ou drogarmo-nos?
desculpem lá, mas não concordo com o texto. embora esteja muito bem escrito, mas isso já é o trivial!
fica bem
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